BLOGUE DA ALA DOS ANTIGOS COMBATENTES DA MILÍCIA DE SÃO MIGUEL

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

DAS ÚLTIMAS PROMOÇÕES NO EXÉRCITO AO COMANDO MILITAR


João José Brandão Ferreira, Oficial Piloto Aviador

«Nenhum dos nossos inimigos se atreveu a
atacar-nos quando reunimos todas as nossas
forças, tanto por causa da nossa experiência
nas coisas do mar, como pelos muitos
destacamentos que temos em diversos
lugares do nosso território».
In, Oração de Péricles, 430 A.C.

O Decreto do PR n.º 1-D/E/F promoveu três majores generais (duas estrelas), do Exército a tenentes generais (três estrelas).[1]

Não estando em causa as pessoas, tão pouco a sua competência profissional, existe um facto, porém, sobre o qual gostaríamos de reflectir digamos, academicamente.

O facto é este, um dos agora promovidos é oriundo do Serviço de Administração Militar.

Ora isto levanta questões no campo dos princípios e da doutrina do Comando Militar.

É certo que o actual EMFAR permite, pelo menos desde 1974, que um oficial desta «especialidade» possa ser promovido, em «situações excepcionais», a general de três estrelas (Art.º 197-4, do actual «emfar»).

E, de facto, de uma excepcionalidade se trata, dado que no Exército, só são conhecidos três casos anteriores a este: o do general Vergas Rocha promovido em 1 de Abril de 1981, a fim de ir ocupar o cargo de chefe da divisão de Administração e Finanças, do EMGFA; do general Victor Mesquita promovido em 4 de Janeiro de 1989, para desempenhar as funções de chefe do departamento de Finanças do EME e do brigadeiro Costa Alves, do Serviço de Material, promovido a três estrelas, em 5 de Março de 1980, para ir ocupar o cargo de director-geral de Armamento (salvo erro).

Promoções que geraram alguma controvérsia.

Excepcional também, porque na Força Aérea e na Marinha, a promoção a oficial general de três estrelas estar reservada, respectivamente, aos pilotos aviadores e aos oficiais oriundos da classe de Marinha.

Cada um destes Ramos tem, porém, uma excepção à regra: a FA através da promoção do brigadeiro Rui Espadinha a três estrelas, em 11/8/82, sendo do quadro de engenheiros aeronáuticos; a Armada, através da promoção a vice-almirante de um oficial oriundo da Administração Naval, de seu nome Alfredo de Oliveira.

O primeiro era bem visto pelo general Lemos Ferreira, tendo sido director das Oficinas Gerais de Material Aeronáutico; o almirante teve a sua promoção em 1 de Abril de 1981, e bem relacionado com o almirante Sousa Leitão, e foi desempenhar funções no EMGFA.

Como curiosidade resta acrescentar que os três oficiais do Exercito, de Administração Militar mencionados, frequentaram o Instituto Militar dos Pupilos do Exército, o mesmo se passando com o actual CEME.

A questão não é pacífica, sobretudo no seio dos oficiais cuja especialidade, classe ou serviço os impede de ultrapassarem as duas estrelas.

Mas estes assuntos raramente são discutidos…

Os cadetes destinados a estes quadros eram, aliás, avisados quando frequentavam a Academia Militar, a Academia da Força Aérea e a Escola Naval (até antes), do topo da hierarquia a que poderiam aspirar.

As próprias disciplinas que lhes davam acesso, nomeadamente a Administração Militar, eram diferentes das outras.

Alguma formação comum e frequência de cursos de promoção em conjunto, há cerca de duas décadas, acaloram o debate.

Outro tipo de divergência (ainda mais grave) – a talhe de foice – tem ocorrido na GNR, com o «forcing» de oficiais cuja formação não foi feita na Academia Militar, quererem ter acesso ao generalato, o que tem sido (mal) apoiado por políticos do MAI, por razões que não vamos agora aduzir.

A Força Aérea, por seu lado, tinha aberto uma outra «excepção», quando decidiu promover oficiais dos quadros técnicos, a coronel, nos idos dos anos 80, quando até então, apenas podiam ser promovidos a tenente-coronel.

A estes oficiais também lhes estava vedado comandar unidades, mas houve numerosas excepções.

Também se passou a nomear oficiais que não eram das Armas para cargos de Adidos de Defesa/Militar, nomeadamente oficiais do quadro de Administração Militar e Aeronáutica, e até se nomeou um oficial fuzileiro, não oriundo da Escola Naval, o que era anti-regulamentar e deu origem a um conflito com o MNE.

Curiosa e significativamente, os países para onde estes oficiais eram (e são) nomeados situam-se em África…

Em síntese as excepções são muitas – o que levanta a questão de porquê uns e não outros – tendo a atenuá-las, razões de falta de pessoal e de, em determinado período, permitir o descongestionamento nas promoções de alguns quadros, que estavam inflacionados de oficiais por via das necessidades da guerra terminada nos idos de 1974/5.

Mas voltando à questão anterior o princípio doutrinário a preservar (se é que tal e pode considerar um princípio doutrinário – e que nos parece estar certo – é o de que quem combate, comanda.

E quem combate, no Exército, são os oficiais (só estamos a falar destes) das Armas (Infantaria, Cavalaria, Artilharia, Engenharia Militar e Engenharia de Transmissões – e sabe-se a controvérsia que houve para passar esta última, a «Arma») e não os dos serviços («que apoiam») como é o caso do Serviço de Saúde, o Serviço de Material e o Serviço de Administração Militar, cujos oficiais são formados na Academia Militar.

Por isso, para além do «Comando» existe a «Direcção» e a «Chefia».

Dito de outra forma, quem deve comandar são os oficiais que, sendo oriundos de uma Academia Militar – é para isso que elas existem – estão na «linha de emprego» dos meios e não os que estão na «linha de sustentação» dos meios. Estes últimos dirigem e chefiam.

Mas porquê, perguntarão ainda os mais relutantes? Pois porque o combate é o fim último da preparação militar e só quem está treinado para o mesmo, está em condições de entender e abarcar as envolventes e as prioridades da complexidade do campo de batalha.

Senão, pela mesma lógica que agora foi utilizada, poderíamos um dia vir a ter como chefe de Estado-Maior, um oficial com a especialidade de médico.

Lembra-se que os veterinários (por enquanto) apenas podem ascender a tenente-coronel…

E agora que temos um general de três estrelas de Administração Militar nada obsta a que não possa ser o futuro CEME…

Ou então, porque não, um qualquer membro da comissão parlamentar de Defesa poder vir a ser chefe de Estado-Maior. Porque não? Dá-se-lhes uns créditos, pim, pam, pum, já está!...

Não digam que não é possível, pois eu já vi de tudo o que nunca esperava ver e até já tivemos em época de suprema rebaldaria, um capitão graduado em general de três estrelas, comandante da Academia Militar!...

*****

Sabe-se que o oficial agora em causa foi escolhido por, entre os possíveis, ter o perfil mais adequado para uma determinada função: o Comando Logístico.

Não contestamos a apreciação e deverá, infelizmente ser o caso, sabendo-se quem fez a escolha.

Mesmo assim, por uma questão do tal «princípio» e da tal doutrina (que pelos vistos não existe) a decisão deveria ter sido ponderada de outro modo.

E aqui levanta-se uma outra questão: é certo que cada um de nós pelas suas experiências, gosto e saber, estará melhor numa determinada função do que noutra, e tal não deixa de ser verdade no âmbito dos oficiais generais.

No entanto, ao nível que estamos tratando (e um general é um «generalista»), qualquer oficial general (das Armas) deve poder ocupar seja que função ou comando exista. E não há muitos. E tal tem muito a ver com as promoções feitas anteriormente.

Também é verdade que há, hoje em dia, muito poucos oficiais generais de três estrelas e que o tempo de permanência no posto não é dos mais alargados (ou seja há pouco por onde escolher), mas isso levar-nos-ia a outras discussões.

Algo que também afecta o «status quo» é a existência do posto de brigadeiro general.

Esta «novidade» não nos parece ter sido boa ideia.

Começou por ser ideia do Exército, tendo sempre a oposição da Marinha e Força Aérea.

A «racional» tinha a ver com os cargos e funções NATO e, eventualmente outros, que eram ocupados por um oficial desse posto (general de uma estrela), e «nós» não podermos concorrer a tais lugares por não termos esse posto nas nossas fileiras.

Com o devido respeito a argumentação não convencia, nem convence. Em primeiro lugar porque havia muito poucos cargos desses a que poderíamos concorrer; depois porque se tal fosse julgado de importância maior, facilmente se poderia enviar um coronel ou capitão de mar-e-guerra tirocinado, ou, mais facilmente se poderia graduar um qualquer oficial desse nível naquele posto.

Além disso o leque de postos em oficial general passou a ser de quatro (mais do que no âmbito dos oficiais superiores) numas Forças Armadas a caminho da extinção.

Tanto se andou nesta discussão do sexo dos anjos, que a proposta acabou por ser aprovada (confesso que não tive pachorra para ir saber em que moldes, nem quando), algures pelo início do século XXI, o que logo foi aproveitado pelos políticos para se diminuir o número de oficiais de duas e três estrelas transformando a pirâmide num paralelepípedo irregular, poupando uns trocos e fazendo um «downgrading» de várias funções.

Consequências espúrias que normalmente não se prevêem…

*****

Ora onde queremos chegar é que no âmbito tratado – como em tantos outros – haja princípios e doutrina, no seio dos Ramos (e não se ponham, deslumbrados, a copiar acriticamente um exemplo qualquer do que se passa «lá fora»), pois há questões que são, por assim dizer, pilares onde assenta o funcionamento da Instituição Militar.

Ora o Comando e a Liderança são o fulcro de toda a actividade militar.
Isto é, aquilo que for considerado importante tem de estar escorado e aceite solidamente, a fim de que as questões fundamentais sejam tratadas de um modo racional. Neste âmbito o «EMFAR» parece ter excepções a mais…

Mais uma vez se frisa a necessidade de preservar princípios; mudar a doutrina só depois de reflexão aprofundada e ser flexível quanto a estratégias, tácticas e técnicas.

Em conclusão as grandes decisões nas Forças Armadas têm que estar sustentadas em princípios e doutrina; a coerência tem que acompanhar toda a estrutura; idem para Leis e Regulamentos e as excepções, elas próprias, só existirem excepcionalmente, para que as coisas, as decisões e as pessoas não andem ao livre arbítrio de quem ocupa transitoriamente uma função ou cargo; ao alvedrio de amizades ou ao interesse do momento.

Resumindo: deve-se definir muito bem quem e porquê pode atingir o topo da hierarquia e tal não deve dar azo a excepções, por incompatibilidade manifesta. E não dar a parecer que a Instituição Militar é uma manta de retalhos.


[1] II Suplemento, Série I, de 2019-01-09, 11773162, do DR n.º 6/2109.





sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

SUBSTITUIÇÃO DA G-3: UM PROBLEMA COM 40 ANOS!


SUBSTITUIÇÃO DA G-3:
UM PROBLEMA COM 40 ANOS!


João José Brandão Ferreira, Oficial Piloto Aviador, 27 de Janeiro de 2019

«A falta de personalidade das elites
portuguesas constitui um perigo
nacional permanente».
Artur Ribeiro Lopes
In, «Política», 141)

A espingarda automática G-3, de origem alemã, foi uma excelente opção para a situação de guerra subversiva com que nos passámos a defrontar a partir de 1961 em Angola, depois na Guiné, em 1963 e, finalmente, Moçambique em 1964.

A ideia de a passar a fabricar em Portugal sob licença foi uma óptima ideia. Aguentou toda a guerra (14 anos), se bem que, para o fim da mesma, já tivesse dificuldade em bater-se com a «Kalashnikov», que a guerrilha passou a usar…

Quando as coisas começaram a serenar em Portugal após o 25 de Novembro de 1975 e se deu início à reconversão das Forças Armadas, para as missões «NATO», que se começou a falar na necessidade de substituir a G-3 por outra mais moderna.

Eu não me importava de ganhar em escudos (não gosto do euro), as vezes que já se falou, desde então para cá, nessa necessidade. E coisa rara e quase nunca vista, tal necessidade nunca foi objecto de contestação…

Já se perdeu a conta as vezes que se debateu o assunto, se lançaram concursos, se fez testes, se escreveram requisitos operacionais, estudos de estado-maior, inserção de verbas na LPM, etc...

Até agora nada.

A G-3 está uma autêntica «balzaquiana» com 58 anos! (creio que as primeiras vieram em 1961).

Entretanto há muito que se deixou de fabricar em Portugal (ainda chegámos a exportar), pois cabeças muito bem pensantes resolveram arrasar com toda a indústria de defesa nacional ao ponto de, hoje em dia, não fabricarmos uma única munição!

A G-3 provou bem, porque era fiável, robusta, simples de manter, não tinha problemas de segurança, tinha uma balística equilibrada, versátil e boa cadência de tiro.

Tinha na HK-21 a sua versão de metralhadora ligeira.

Ora, uma espingarda automática é, digamos assim, o esteio do armamento de um exército. A arma que dá a cada soldado a sua capacidade individual e colectiva, no âmbito defensivo e ofensivo.

Nestas coisas convém ter em conta o provérbio português que reza assim: «o barato sai caro». Por isso se deve apostar numa boa escolha, mesmo que seja mais cara. Vai prevenir muitos problemas no futuro; ser mais económico a longo prazo e, «last but not the least», poupar muito sangue em combate e até na instrução.

É preferível, não havendo dinheiro, comprar menos e deixar opções para o futuro, do que comprar mais e pior. Já se cometeu muitas vezes este erro no nosso país (a GNR tem ao que se conta, em «armazém», uns milhares de pistolas – metralhadoras compradas há muitos anos, a um país da América do Sul e nunca utilizadas, por ex.).

Por norma quando se compra uma arma destas, deve tentar-se alargar o seu âmbito à Força Aérea e Marinha, e também às Forças de Segurança por razões óbvias de economia, cadeia logística, manutenção, gestão de «stocks», interoperacional idade, uniformização e flexibilidade de emprego.

Não esquecendo de garantir mais do que uma fonte de fornecimento, de modo a não estarmos apenas dependentes de uma só.

Sempre que possível devem ser estabelecidas «reservas de guerra».

Na compra de um novo sistema de armas existem actualmente dois problemas. Um, antigo como a mais antiga profissão do mundo, é o costume das comissões.

Lidar com isto é um quebra-cabeças que só uma legislação e fiscalização apurada conseguem gerir a níveis adequados.

O outro que se tornou uma espécie de moda é o de no fim de um concurso público, uma ou mais das partes vencidas, interpôr nos tribunais, uma providência cautelar. Sair disto passou a ser outro quebra-cabeças.

Daí se tentar fazer compras por ajuste directo, o que levanta vários outros problemas, um dos quais é o tecto orçamental permitido em tal caso (220.000 euros).

Quando os negócios são apetecíveis e existem um ou mais países interessados no mesmo, a política e a diplomacia entram em acção de um modo sub-reptício, tentando influenciar e ou negociar por todos os meios possíveis, a escolha do produto que lhes interessa.

Obviamente que nenhuma destas acções é, por norma, transparente, vindo a saber-se das verdadeiras razões de uma decisão, apenas por «fuga de informação».

O chefe de Estado belga (Rei Philippe e Rainha Matilde) visitou o nosso país entre 22 e 24 de Outubro de 2018, mas nada do que transpareceu da visita pode levar à conclusão, que este assunto tenha sido abordado.


*****

Serve este arrazoado como introdução ao actual concurso público internacional em curso, só há pouco tempo publicitado, que – vamos a ver se é desta – parece estar na fase final para se decidir a compra de uma espingarda automática que vá finalmente substituir a G-3.

Mas antes de prosseguirmos convém ainda recuar a um passado próximo para avaliar melhor o que está em jogo.

Nos últimos 40 anos, os paraquedistas, graças à autonomia que a chefia da Força Aérea lhes garantia (antes de passarem para o Exército – uma decisão assaz escusada), tinham comprado um lote de espingardas israelitas «Galil», de calibre 5,56mm, a primeira arma deste calibre a equipar forças portuguesas. Tal ocorreu em 1979, estando já com um grau de obsoletismo elevado.

Nos anos mais recentes as compras de armamento ligeiro, sempre efectuadas em pequenos lotes e normalmente por ajuste directo (para fugir às demoras e impugnações normais nos concursos públicos), foram as seguintes (não é exaustivo nem inclui pistolas e pistolas metralhadoras):

EXÉRCITO:
Operações Especiais (CTOE)
Espingarda automática HK 416A5 (calibre 5,56);
Espingarda automática HK 417A2 (calibre 7,62);
Espingarda de precisão HK G28 (calibre 7,62);
Lança granadas HK 269 (calibre 40 mm);
Espingarda automática HK G36 (calibre 5,56);
Metralhadora ligeira HK MG4 (calibre 5,56).

Comandos:
Espingarda automática HK G36;
Metralhadora ligeira HK MG4;
(A maior parte do pessoal ainda equipado com a G-3 e a SIG SG 543).
Restante pessoal do Exército equipado com G-3.

MARINHA:
Destacamento de Acções Especiais (do Corpo de Fuzileiros):
Espingarda automática HKG36;
Lança granadas HK AG36 (calibre 40 mm)

Polícia Marítima (Grupo de Acções Tácticas):
Espingarda automática HK 416A5.
Restante pessoal da Armada usa a G-3

FORÇA AÉREA:
Grupo de Controlo Aéreo Táctico (TACP):
Espingarda automática HK 416A5

Unidade de Protecção de Força (UPF):
Espingarda automática HK G36;
Espingarda de precisão HK G28;
Lança granadas HK AG36 (calibre 40mm);
Metralhadora ligeira HK MG4;
Metralhadora média HK MG5 (calibre 7,62).
Restante pessoal da Força Aérea utiliza a G-3.

GNR (Unidade de Operações Especiais):
Espingarda automática HK 416A5;
Espingarda automática HK 417A2;
Lança granadas HK 269 (calibre 40mm);
Espingarda automática HK G36;
Restante pessoal da GNR usa a G-3.

PSP / GOE:
Espingarda automática HK G36 (e outras);
Lança granadas HK AG36 (calibre 40mm).
Restante pessoal da PSP usa a G-3.

Os dois últimos concursos públicos que se conhecem, em que se tentou comprar uma espingarda automática, ocorreram em 2004 (creio) e depois em 2006 O primeiro, teve o apoio de um departamento técnico do Instituto Superior Técnico, no âmbito da análise multicritério, que acabou impugnado por uma das partes que concorreu; e o segundo foi expurgado do que poderia vir a constituir base de impugnação, tendo-se realizado testes exaustivos, em Mafra.

Quando estava tudo pronto, por razões que o abaixo – assinado desconhece, não houve decisão sobre o assunto e o concurso aparentemente, morreu de morte natural.

É necessário dizer que tais concursos são muito complexos, trabalhosos e caros, necessitando de um grande investimento das partes concorrentes. Por vezes os resultados (sempre demorados) podem dar origem a indemnizações.

Por outro lado parece haver uma facilidade muito grande dos juízes dos tribunais aceitarem toda a providência cautelar que lhe é submetida, pondo-se ainda a questão de se saber qual o grau de conhecimento que um tribunal dispõe para avaliar sumariamente, um assunto de tamanha complexidade e especificidade. Mesmo avaliando apenas a matéria jurídica.

A novidade do actual concurso para aquisição da nova arma foi o facto de ter sido atribuído à «NATO Support and Procurement Agency» (NSPA), (antiga NAMSA), servindo assim de uma espécie de intermediário do Estado Português.

A definição dos requisitos operacionais foi atribuída ao Estado-Maior do Exército (a arma destina-se a este Ramo e não aos outros, o que consideramos um erro, como acima já ventilado), sem a ingerência da antiga direcção-geral de Armamento e Equipamento do MDN, agora direcção-geral de Recursos.

Para acompanhar o assunto foi constituído um grupo de trabalho, cujos membros estão referidos no despacho supra dois dos quais são da direcção-geral de Recursos).

Não se sabe exactamente porque se optou por esta modalidade de aquisição, mas estamos em crer, que assim se tenta evitar o problema das «comissões» e passando a pressão de eventuais «lobbies» para a NSPA.

Além disso desaparece o problema das «contrapartidas», se é que as há, que eram uma dor de cabeça para negociar e depois ninguém cumpria…

Porém, o Estado Português demitiu-se de, certo modo, em escolher o que melhor lhe servirá; não se sabe bem que testes e avaliações serão feitos, bem como o número de concorrentes, tornando-se mais difícil ter acesso a toda a informação existente daí a importância do tal GT mencionado).

Aparentemente o processo está avançado e existem duas armas em «competição» final: a FN, belga (modelo SCAR) e a HK 416A5 e A2, alemãs.[1]

Sem entrarmos em especificações técnicas, convém dizer que, por decisão ministerial, a arma a comprar deve estar já em uso em dois países da NATO.

Torna-se ainda necessário definir o que se entende como arma de serviço padrão e arma de serviço limitado.

Basicamente a definição de «padrão» destina-se a uma arma que irá equipar um ou mais ramos das Forças Armadas; enquanto as «serviço limitado», são de emprego restrito ou especializado.

Existe alguma controvérsia sobre a necessidade ou pertinência de, actualmente, haver esta distinção.

Ora se for verdade que as duas armas supra indicadas são as finalistas, a espingarda alemã leva grande vantagem (não se conhece se houve mais concorrentes).

Em primeiro lugar porque está em uso em muitos países da NATO: a França, a Noruega, a Alemanha, a Holanda e, pasme-se, os EUA. Enquanto a FN apenas equipa as forças belgas e, em parte as da Lituânia.

As HK 416 A5/A2, já foram amplamente testadas em combate e têm dado muito boa conta de si, não havendo aspectos negativos reportados.

Acresce que já está em uso em várias unidades e subunidades dos três Ramos e na GNR…

Aparentemente a FN tem a seu favor o preço e o facto da fábrica da espingarda alemã, dado o volume de encomendas que tem, ter mais dificuldade em entregar a totalidade das armas nos prazos requeridos (até 2022).

As quantidades de material a adquirir pelo Estado Português estão especificadas no Despacho Ministerial já referido, num total de 42 milhões e 828 mil euros (divididos em seis anos – 2017-2022), e estão assim discriminadas:

– Onze mil espingardas automáticas (5,56mm);
– Trezentas espingardas automáticas (7,62mm);
– Oitocentas e trinta metralhadoras ligeiras (5,56mm);
– Trezentas e vinte metralhadoras médias (7,62mm);
– Quatrocentas e cinquenta espingardas de precisão (7,62mm);
– Mil e setecentos lança-granadas;
– Trezentas e oitenta caçadeiras;
– Três mil e quatrocentos aparelhos de pontaria.

As verbas a utilizar são as consignadas na Lei de Programação Militar (até hoje nunca nenhuma destas leis foi cumprida e cada vez que são revistas, sofrem cortes…).


*****

À laia de conclusão não faz muito sentido, que as forças nacionais, não tenham todas a mesma arma, e por maioria de razão, as Forças Especiais.

Veja-se o que aconteceu recentemente na República Centro-Africana em que o pessoal dos comandos foi para lá armado de G-3 e quando foram substituídos pelos pára-quedistas, para não se ter que se transportar as G-3 para cá e levar as «Galil» (que os páras usam) para lá, teve que se reconverter a companhia de pára-quedistas à G-3…

E assim estamos em vias (embora seja mais prudente actuar como o S. Tomé) de resolver, apesar de parcialmente, o magno problema da substituição da «velhinha» G-3, por uma arma adequada aos tempos e necessidades actuais.

Já que se esperou tanto tempo, ao menos que se escolha bem.

Agora já não há a desculpa de estarmos «orgulhosamente sós», sermos uns «perigosos colonialistas» e ninguém nos querer vender seja o que for…

Isto de comprar armamento exige competências alargadas e foi sempre um caso «bicudo»…


[1] Não deixa de ser curioso que no seguimento da eclosão da barbárie genocida em Angola, em 1961, se tenha tentado comprar espingardas FN belgas, mas o governo belga torceu o nariz ao negócio (por razões políticas) e foram os alemães que se dispuseram a vender a G-3.





domingo, 3 de fevereiro de 2019

França e Alemanha: «Estamos comprometidos com a criação de um exército europeu»


A chanceler alemã Angela Merkel salientou recentemente que o novo pacto
entre a Alemanha e a França visa estabelecer uma «cultura militar comum» franco/alemã

 e «contribuir para a criação de um exército europeu.»
Foto: soldados da brigada franco/alemã, unidade militar criada em 1989,
consistindo em unidades conjuntas dos exércitos francês e alemão.
(Foto: Sean Gallup/Getty Images)

Soeren Kern, Gatestoneinstitute, 30 de Janeiro de 2019

Original em inglês: France and Germany: «We Are Committed to the Emergence of a European Army»

Tradução: Joseph Skilnik
  • «O populismo e o nacionalismo estão a avançar em todos os países europeus. Pela primeira vez, um país, a Grã-Bretanha, está a deixar a União Europeia. No mundo inteiro o multilateralismo está sob pressão...» – chanceler alemã Angela Merkel.
  • «Convergir em tão alto grau em relação à Alemanha é abdicar da soberania, uma traição. Se não tivéssemos alertado o povo, o texto teria sido assinado na calada da noite. O texto prevê, mormente, a necessidade de legislar caso haja obstáculos à cooperação franco/alemã... Não quero mais convergência com Berlim, seja em questões sociais ou de segurança, nem mesmo tratando-se de consultas estreitas no Conselho de Segurança da ONU.» — Marine Le Pen, no jornal Le Temps.
  • «Emmanuel Macron quer um grandioso debate com cidadãos que participam na vida pública do nosso país. Ao mesmo tempo, porém, o presidente da República negociou um tratado às escondidas, muito embora esse tratado diga respeito às condições essenciais para o exercício da nossa soberania nacional. Nem o povo francês, nem o Parlamento, nem o Conselho Constitucional foram consultados... Por inúmeras razões, este tratado passa por cima da nossa soberania nacional.» – Nicolas Dupont-Aignan, líder do partido Debout La France! (França, de Pé!!).
O presidente francês Emmanuel Macron e a chanceler alemã Angela Merkel assinaram um novo tratado de amizade franco/alemão que visa revigorar a União Europeia, atingida pelo rombo financeiro, migração em massa e o Brexit, bem como os inúmeros interesses e prioridades conflitantes entre os 28 estados membros.

A França e a Alemanha, autoproclamadas guardiãs da integração europeia, salientaram que o novo tratado é uma resposta à crescente influência de populistas na Áustria, Grã-Bretanha, França, Itália, Hungria, Polónia e outros países europeus que procuram aperfeiçoar ou até mesmo reverter a integração europeia, resgatar da União Europeia a soberania nacional e transferir os poderes agora nas suas mãos de volta às capitais de cada país.

O cabo de guerra no velho continente que ameaça dividir a União Europeia ao meio, de um lado os nacionalistas eurocépticos e do outro os globalistas «eurófilos», promete aquecer nas próximas semanas que antecedem as eleições para o Parlamento Europeu no final de Maio de 2019.

O «Tratado de Aachen» (Traité d'Aix-la-Chapelle; Vertrag von Aachen), assinado em 22 de Janeiro na cidade alemã de Aachen, consiste de 28 artigos organizados em sete capítulos, ambos os países se comprometem empreender estreita cooperação na esfera política. Os primeiros oito artigos, que abrangem a política bilateral externa e de defesa, bem como a União Europeia, são os itens mais ambiciosos e marcantes do tratado:
  • No Artigo 1.º os dois países assumem o compromisso de estreitar a cooperação no tocante à política europeia, «promovendo uma política externa e de segurança comum, forte e eficiente, reforçando e aprofundando a União Económica e Monetária».
  • No Artigo 2.º os dois países assumem o compromisso de «se consultarem regularmente em todos os níveis hierárquicos antes das mais importantes reuniões europeias, procurando estabelecer um denominador comum, alinhando os discursos dos seus ministros. Eles coordenarão a transposição do direito europeu para o direito nacional dos seus respectivos países.»
  • No Artigo 3.º ambos os países assumem o compromisso de «aprofundar a cooperação em relação à política externa, defesa, segurança interna e externa, desenvolvimento e simultaneamente não medir esforços no sentido de fortalecerem a capacidade autónoma de acção da Europa». Os dois países também se comprometem a «averiguar minuciosamente, em parceria, com a finalidade de definir posições comuns sobre qualquer decisão chave que afecte os interesses comuns e agir em conjunto em todas as situações cabíveis».
  • No Artigo 4.º os dois países assumem o compromisso de «convergir cada vez mais nos seus objectivos e políticas com respeito à segurança e defesa». Prestar assistência um ao outro sem medir esforços, fazendo uso de todos os meios disponíveis, como as forças armadas, em caso de ataques armados contra os seus territórios. «Eles também se comprometem a fortalecer a capacidade de acção da Europa e investir conjuntamente para suprir as necessidades funcionais, fortalecendo a União Europeia e a Aliança do Atlântico Norte. OTAN)» Pretendem promover a competitividade e a consolidação da base industrial e tecnológica da defesa europeia... apoiam a cooperação mais estreita possível dae suas indústrias de defesa fundamentadas na confiança mútua... ambos os países desenvolverão uma abordagem comum no que tange às exportações de armas com respeito a projectos conjuntos. Os dois países «estabelecerão o Conselho de Defesa e Segurança Franco/Alemão como o órgão político para administrar os compromissos de ambas as partes. O Conselho reunir-se-á regularmente ao mais alto nível hierárquico.»
  • No Artigo 5.º ambos os países assumem o compromisso de «expandir a cooperação entre os ministérios de relações exteriores, incluindo as suas missões diplomáticas e consulares», alinhar o posicionamento nas Nações Unidas e na OTAN.
  • No Artigo 6.º os dois países assumem o compromisso de «fortalecer ainda mais a cooperação bilateral na luta contra o terrorismo e o crime organizado, bem como a cooperação judicial e nas questões de inteligência e polícia».
  • No Artigo 7.º ambos os países assumem o compromisso de «estabelecer uma parceria ainda mais estreita entre a Europa e a África... com o objectivo de melhorar as perspectivas socio-económicas, sustentabilidade, boa governança, prevenção de conflitos, resolução de crises, especialmente no contexto da manutenção da paz e gestão de cenários problemáticos pós-conflitos».
  • No Artigo 8.º os dois países assumem o compromisso de «cooperar conjuntamente em todos os órgãos das Nações Unidas». Irão «alinhar as suas posições, o que será parte integrante de um esforço concentrado de ampla consulta entre os países membros da UE que fazem parte do Conselho de Segurança da ONU e de acordo com as posições e interesses da União Europeia». «Não medirão esforços para alcançar um posicionamento uníssono da União Europeia nos órgãos adequados das Nações Unidas». Os dois países também «se comprometem a continuar com os programas de reformas no Conselho de Segurança das Nações Unidas». A admissão da Alemanha como membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas «é uma prioridade da diplomacia franco/alemã».
O restante do tratado promete uma cooperação bilateral mais estreita nas áreas da inteligência artificial, mudanças climáticas, questões fronteiriças, cultura, assuntos económicos, educação, energia, meio ambiente, saúde e desenvolvimento sustentável, entre outras coisas.

O discurso da chanceler Merkel em Aachen, lembrou que a cidade era o lar de Carlos Magno (742/814), que destacou como «pai da Europa». Salientou que o novo pacto visa estabelecer uma «cultura militar comum» franco/alemã e «contribuir para a criação de um exército europeu». Ainda destacou:

«O populismo e o nacionalismo estão a avançar em todos os países europeus. Pela primeira vez, um país, a Grã-Bretanha, está a deixar a União Europeia. Nos quatro cantos do planeta, o multilateralismo está sob pressão, seja na cooperação climática, no comércio mundial, na aceitação de instituições internacionais até mesmo nas Nações Unidas. Setenta e quatro anos, o ciclo de uma vida, após o término da Segunda Guerra Mundial, o que parecia ser o óbvio ululante é mais uma vez posto em dúvida.

«De modo que, em primeiro lugar, essa situação exige uma nova viga mestra no tocante à nossa responsabilidade dentro da União Europeia, a responsabilidade da Alemanha e da França nessa União Europeia. Em segundo lugar, requer uma redefinição de rumo da nossa cooperação. Em terceiro lugar, requer uma leitura comum do nosso papel no cenário internacional, o que poderá levar a uma acção conjunta. Por isso, em quarto lugar, há a necessidade de compartilhar similaridades entre os nossos dois povos, nas instituições, mas acima de tudo no quotidiano dos nossos povos, especialmente nas regiões fronteiriças...

«Assumimos o compromisso de desenvolver uma cultura militar comum, uma indústria de defesa comum e uma linha comum no tocante à exportação de armas. Queremos contribuir para o nascimento de um exército europeu».

Macron, também discursando em Aachen, destacou: «no momento em que a Europa é ameaçada pelo nacionalismo, que se está avolumando, a Alemanha e a França devem assumir as suas responsabilidades e mostrar o caminho a seguir». Disse que o acordo é um «momento importante» para mostrar que o relacionamento bilateral é «um baluarte capaz de se autorenovar... com o propósito de consolidar o projecto europeu». Macron defendeu a União Europeia como sendo um «escudo contra os tumultos no mundo».

O tratado, no entanto, é parco quanto a detalhes e pode acabar por ser mais simbólico do que concreto. Merkel e Macron estão a ver as suas autoridades em franco declínio e ainda não está claro se terão o capital político necessário para por em movimento a integração europeia. A Alemanha está agora de olho na era pós-Merkel, depois dela ter anunciado que se afastará do cargo de chanceler em 2021. Macron está às voltas com uma onda de protestos de alcance nacional que ainda pode derrubar o seu governo.

O tratado foi recebido com um misto de raiva e indiferença.

Em França, Marine Le Pen, líder do partido populista União Nacional (antiga Frente Nacional), salientou que o tratado solapa a soberania nacional, acusando Macron de «vender» a França para os alemães. Em entrevista concedida ao jornal Le Temps de Genebra sustentou:

«Convergir em tão alto grau em relação à Alemanha é abdicar da soberania, uma traição. Se não tivéssemos alertado o povo, o texto teria sido assinado na calada da noite. O texto prevê, mormente, a necessidade de legislar caso haja obstáculos à cooperação franco/alemã. A nação francesa é una e indivisível e a lei não pode ser aplicada de maneira diferente nas regiões que fazem fronteira com a Alemanha. Há a letra do tratado, mas também há o espírito do tratado. Não quero mais convergência com Berlim, seja em questões sociais ou de segurança, nem mesmo tratando-se de consultas estreitas no Conselho de Segurança da ONU. O assento permanente da França no Conselho de Segurança foi duramente conquistado durante a Segunda Guerra Mundial e tornou a França uma grande potência. Por isso em dúvida, seria deixar ir pelo ralo a conquista do general de Gaulle.»

Nicolas Dupont-Aignan, líder do partido soberanista Debout La France! (França, de Pé!) salientou:

«Em nenhuma circunstância esse tratado de amizade franco/alemão poderá vir a ser um pretexto para a submissão. No entanto, parece que é esse o caso.

«Primeiro, o método de concepção do tratado. Diante da crise democrática pela qual o nosso país está a passar, Emmanuel Macron quer um grandioso debate com cidadãos que participam na vida pública do nosso país. Ao mesmo tempo, porém, o presidente da República negociou um tratado às escondidas, muito embora esse tratado diga respeito às condições essenciais para o exercício da nossa soberania nacional. Nem o povo francês, nem o Parlamento, nem o Conselho Constitucional foram consultados.

«Segundo, o conteúdo do tratado. Em termos concretos, inúmeras estipulações do tratado visam compartilhar com a Alemanha os poderes soberanos e as prerrogativas da França. Com efeito, se a defesa mútua é parte integrante do tratado, então a França está a ceder à Alemanha as benesses do seu poderio militar, invejados nos quatro cantos da terra: (a quinta maior potência militar do mundo, dissuasão nuclear, etc.) (Artigo 4.º). A França proporciona à Alemanha acesso à sua rede diplomática, a terceira maior do mundo, atrás somente dos Estados Unidos e da China (Artigo 5.º). A França proporciona à Alemanha acesso indireto ao seu assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, coordenando as suas posições como também coordenando as suas decisões (artigo 8.º). A França quer que a Alemanha tenha um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, fazendo disso uma «prioridade» diplomática (artigo 8.º). Por inúmeras razões, este tratado passa por cima da nossa soberania nacional.

«E por fim, falta de reciprocidade. Enquanto a Alemanha leva vantagem em cima dos pontos fortes da França como potência mundial em diplomacia e defesa, a Alemanha não oferece nenhuma reciprocidade à altura.É por isso que o Tratado de Aix-la-Chapelle não é um acto de cooperação franco/alemão, mas de submissão da França à Alemanha.

«Na realidade, esse tratado, via de mão única, é um insulto ao relacionamento amigável que a França mantém com a Alemanha. Tendo em vista as concessões feitas pela França à Alemanha, sem contrapartida, o texto hoje assinado em Aix-la-Chapelle configura um verdadeiro acto de traição».

Na Alemanha, Alexander Gauland e Alice Weidel, líderes do partido populista Alternativa para a Alemanha (AfD), divulgaram uma nota:

«O Tratado de Aachen é um passo na direcção errada. Sob o pretexto da cooperação europeia, o tratado é o resultado do interesse francês de transferir e redistribuir o poder alemão, em detrimento dos contribuintes alemães. O tratado também criará uma relação especial franco/alemã que alienará a Alemanha frente aos demais países europeus.

«O porta-voz da AfD Alexander Gauland explica: o presidente francês Macron é incapaz de manter a ordem no seu próprio país. Os protestos em todo o território francês não vão parar nunca. Este presidente fraco está a impor visões para o futuro da Alemanha. A UE está agora seriamente dividida. Um relacionamento especial franco/alemão alienara-nos-á ainda mais em relação aos demais europeus. Isso torpedeia, ao pé da letra, aquelas ideias europeias que Merkel e Macron invocam de maneira tão calorosa. Parece que suspeitam que a UE, do jeito que está, se irá esfarelar.»

«A líder da AfD no Bundestag (parlamento da República Federal da Alemanha), Dra. Alice Weidel, destaca: esse tratado é uma submissão inaceitável de uma chanceler eleita diante de um presidente que passa por poucas e boas. Macron conseguiu o que queria: a Alemanha assumiu compromissos, por exemplo no primeiro artigo: fortalecer e intensificar a União Económica e Monetária, por outras palavras, financiar a transferência e a redistribuição de riqueza.»

«Macron promete acesso mais rápido e mais fácil ao dinheiro dos contribuintes alemães para poder continuar com a política inflacionária francesa e custearas  suas promessas eleitorais. Já apresentou planos concretos para tanto e recebeu muitos aplausos dos tradicionais partidos alemães.»

«A França também deverá ser a principal beneficiária da planejada cooperação intensificada das forças armadas que tem o propósito de realizar operações conjuntas e na consolidação da indústria de defesa europeia, que também está prevista no tratado. O Artigo 4.º do tratado abre as portas para novos e questionáveis envios de tropas para África e a venda suplementar da tecnologia alemã sob a égide das joint ventures dominadas pelos franceses.»

«Esses pontos de interesse da política francesa estão inseridos na deplorável afirmação do óbvio e de uma pletora de medidas simbólicas e bem intencionadas declarações de intenção. Fora aos europeus como um todo, de que maneira esse tratado também servirá aos interesses alemães, permanece um mistério. O acordo reforça a rusga com os estados membros da UE que não querem um 'Superestado Europeu' franco/alemão. O Tratado de Aachen é, portanto, não apenas supérfluo, mas também contraproducente».